quarta-feira

relato mudo

Eram dezenove horas. Ele entrava pela porta enquanto eu esperava com o coração vibrando pela espera de um abraço. Eu não queria, mas a partir daquele momento eu teria que aprender a viver sem ele; teria que entender que meus dias não seriam mais os dias dele; teria que aceitar a realidade, bruta, de não ser tocada. Os dias, a partir daquele instante, seriam tempestuosos. Meu rosto não ficaria vermelho devido a vergonha, mas devido as lágrimas que desceriam pelos olhos que não conseguiriam enxergá-lo. Eu ansiava que tudo fosse belo, singelo, incondicional. Que a felicidade superasse, todos os dias, a tristeza. Foi assim, não é mais. Agora eu deveria achar um caminho, fazer com que nada me lembrasse a presença dele, e isso era o passo mais difícil. O carinho e as conversas ficarão presas no ar, nas paredes da sala. O perfume e o modo de abraçar ficarão eternizados cada vez que eu olhar para o sofá. O sorriso será lembrado sempre que eu olhar pela janela e sentir o vento batendo no meu rosto. Aquele olhar pensativo passará pela minha cabeça sempre que eu olhar para os livros. Eu vou sorrir sempre que eu olhar para a minha mão e lembrar do modo como ele a segurava. Eu fecharei os olhos sempre que eu quiser sentir o seu rosto, por que eu gravei cada centímetro com o toque. Vou me surpreender, novamente, quando eu ver a flor que hoje seca entre páginas. Eu vou olhar para a porta e esperar anciosamente pelo dia que ele irá voltar. Vou esperar sentada ao lado, entre lágrimas de quem um dia amou de verdade. Ele saiu pela porta que entrou, para não mais voltar. Ele me deixou sozinha. Eu me apaixonei pelo cara errado. Por que a gente procura o cara errado. Segundo Luís Fernando Veríssimo: é a pessoa errada que te faz perder a cabeça, fazer loucuras, perder a hora; a pessoa errada vai te fazer chorar, mas vai secar suas lágrimas. Ele secou as minhas, com o toque mais sincero. Ainda assim, vou vê-lo quando eu caminhar no parque, abraçar o travesseiro, me deitar na cama, sentar no sofá. Vou ver mesmo que ele não esteja ali, porque dentro de mim a presença dele ainda é forte. O nome dele ainda ecoa na minha cabeça, nos meus versos, nas minhas paredes. O perfume dele permanece na minha roupa, no ar que circula. Ele saiu pela porta, mas deixou um pedaço aqui. Eu vou respirar as lembranças, vou chorar a ausência, vou tocar o vazio. Vou amar, por que o amor não vai embora, ele permanece aqui para falar dele, para falar de nós.

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